MPeL7 - Disciplina Educação da Sociedade em Rede
Tópico 5 - A virtualização
das relações sociais
@tividade 4 - Autenticidade
e Transparência na rede”.
Nota: Utilizaremos o formato Pergunta & Resposta
(P&R) para desenvolver este tópico. O anexo complementa as ideais
apresentadas
·
Professor António Teixeira: “O fenómeno dos Chinese Boys constituiu um tremendo
sucesso internacional típico da rede social You Tube e que só o advento desta tornou possível (cerca de 15
milhões de visualizações em 8 anos)…”
Parte
I - O
fenómeno dos Chinese Boys
Pergunta
(P) - Pela
análise do registo, torna-se evidente a confusão entre distintos valores
culturais e societais que caracteriza o mundo virtual da rede. Nesta comédia de
enganos, quem é afinal quem?
Resposta
® – Os Chinese
Backstreet Boys são apenas mais um grupo de
jovens que gostam de cantar e que atualmente podem divulgar as suas atuações
usando a Rede, neste caso o YouTube. Este fenómeno não é recente. No filme
português de 1938 realizado por Chianca de Garcia – A Aldeia da Roupa Branca – recentemente transmitido na RTP1, é
visível a prática generalizada das personagens, nomeadamente as jovens,
cantarem as canções mais populares da época copiando os cantores profissionais
que também entram na trama desta comédia que retrata muito bem o Portugal
atrasado e iletrado de há um século.
No YouTube é possivel visualizar todo o filme (com legendas) em http://www.youtube.com/watch?v=qdZJbbBL1_8
Na década de 60
surge o fenómeno dos Beatles (e outros cantores) adorados pelos jovens e odiados
pela maior parte dos seus pais. A televisão, que então se generalizava, foi uma
das forma de transmitir e distribuir estes novos fenómenos sociológicos.
É
também em 1965 que John Lennon (a principal figura dos Beatles) em entrevista
ao Evening Standard afirmou: "Christianity
will go. It will vanish and
shrink ... We're more popular than Jesus now—I don't know which will go
first, rock and roll or Christianity."[ (http://en.wikipedia.org/wiki/John_Lennon). Compreende-se a intensa reação negativa
que houve nesta altura em resposta a esta afirmação. Aqui está um exemplo como
a autenticidade então (e hoje) é tão relativa.
É também nesta década
que surge no Japão o Karaoke (http://en.wikipedia.org/wiki/Karaoke)
rapidamente divulgado nos EUA e noutros
países. Desde há anos tenho o hábito, nas férias de verão passadas no Algarve,
de frequentar bares com karaoke, onde
portugueses e estrangeiros acompanham as suas músicas preferidas (colocadas
pelo DJ a pedido) com a sua voz que lê as legendas que vão surgindo no ecrã do
televisor. Ou seja fingir faz parte da natureza humana. E quando se sabe que
não somos o original não vem mal ao mundo. O problema coloca-se quando
pretendemos assumir um papel, uma responsabilidade ou uma ação que é
deliberadamente dirigida ao engano, muitas vezes para obter ganhos pessoais ou
de grupo que não são legítimos nem eticamente aceitáveis.
P - Quem são estes
rapazes? Será que importa sabê-lo? Não são eles precisamente para a rede apenas
os «chinese boys» que a rede produziu?
R – Estes rapazes são
jovens que pretendem ser conhecidos, como é tão natural terem esta aspiração. E
são um produto da Web como há milhares ou milhões a surgirem em cada dia. A sua
relevância depende de quem os acede. Uma conclusão é autêntica: ninguém os vai confundir
com os cantores originais. São apenas imitadores
P - Qual é, então, a
sua verdade?
R – Como
são autênticos podemos considerar que são verdadeiros. Não constituem um
problema de identificação. Infelizmente a Web está cheia de “personagens
falsas”, avatares que muitas vezes provocam problemas graves, principalmente
entre as crianças, os jovens e os adultos crédulos. O artigo publicado no
Diário de Notícias de13 dezembro 2013 com o título Falsos “amigos” no Facebook”,
de Paulo Pereira de Almeida, avança com uma proposta de regulamentação sempre
perigosa quando se pensa nos princípios a defender na net (anexo página# 5).
Curiosamente as burlas continuam a existir no mundo fora da rede como a notícia
de 12 de janeiro deste ano bem documenta (anexo página#6). Este risco de sermos
burlados fora da rede é muito significativo tendo em conta que dados recentes
documentam que 33% dos portugueses nunca usaram a internet (anexo página #7).
Estes apenas poderão ser enganados utilizando as tecnologias tradicionais em
que o falar bem e escrever claro são requisitos essenciais à aplicação da prática
da burla (como aquelas realizadas pela Dona Branca, banqueira do povo português
ou o celebre Madoff da gigantesca burla do subprime
norte-americano).
Parte
II
P - Quem
são e como são verdadeiramente esses outros que encontramos na rede? Que são
eles por detrás das máscaras que constroem na rede?
R – Em
regra não sabemos bem quem são aqueles que encontramos na rede (e até na rua ou
no ambiente profissional). Por isso devemos ser cautelosos nomeadamente em
relação ao que é afirmado ou solicitado. Tal como informa o filósofo e
sociólogo alemão Jürgen Habermas (nascido a 1929) na sua recente conferência na
reunião sobre o Livro Digital (que decorreu na Fundação Calouste Gulbenkian a
28 outubro 2013) “… faço um uso bastante selectivo da internet, apenas para
fins académicos. Não participo nas redes sociais…” (anexo página#8). Esta
atitude, que é a minha atualmente (em vias de migrar para o componente válida
destas redes), é uma boa defesa contra os “imitadores amorais ou imorais” que
podem invadir a web.
P - Que
somos nós próprios na rede?
R – Resposta
delicada. Como no Carnaval podemos querer simular ou fingir uma personagem que
não somos. Se mantivermos uma atuação profissional, norteada pelos valores e
ética ocidentais, seremos nós próprios, sem nos envergonharmos. Se nos
enganarmos ou levarmos outros ao engano, pediremos desculpa e assumiremos a
responsabilidades dos nossos atos.
P - Somos
ou poderemos ser transparentes?
R – Procurei
nos dicionários o significado de Autenticidade e Transparência no contexto
desta reflexão (anexo, página 2 e 3). A Transparencia significa : “Carácter do
que deixa transparecer toda a realidade das coisas, do que exprime a verdade de
um facto, acontecimento … sem o alterar”. Gostaria de realçar o conceito da
transparência significar que nós não alteramos as coisas, os factos, os
acontecimentos. Mas a sabedoria popular diz: “Quem conta um conto acrescenta um ponto”. Na web dos Chinese Backstreet Boys a regra é acrescentar algo, por
vezes distorcer ou caluniar. É curioso que Terry Anderson dá uma definição de
Transparência (quando fala em Open Access-OA) que é diferente: (anexo página#
4): “The ability to view and share
thoughts, actions, resources, ideas and interests of others”. E dentro do
espirito do OA podemos (devemos?) alterar aquilo que entendermos.
Mas mesmo numa
esfera com códigos de conduta (como a área comercial e de marketing) as manipulações são bem conhecidas. Os anúncios sobre
produtos com efeito medicinal que são difundidos na nossa televisão (produtos para
a memória, para dormir, para a esfera sexual, vitaminas, etc.) são todos
falsos, ou melhor, fazem afirmações que não são verdades ou que não estão
documentadas como corretas. Como foi publicado, no Diário de Noticias de 5 de
janeiro 2014, as próprias marcas influenciam os estudos científicos (anexo,
página#9 ).
Outro exemplo da
dificuldade em sermos autenticos e transparentes é o artigo, titulo de capa do
semanário Visão (de Lisboa): “Viver Mais e Melhor - O Milagre da Vida “Hi-Tech”.
Apesar da fonte poder ser considerada idónea (o semanário Le Nouvele
Observateur de Paris) e das afirmações terem todas algum sustentáculo científico,
a sua apresentação “simplista” cria expectativas inapropriadas. O aumento da
longevidade da espécie humana deve-se mais aos avanços no saneamento basico e às
vacinações do que à Medicina Hi-Tech que apenas irá beneficiar uma pequena
percentagem da população e com custos operacionais muito elevados.
Numa área mais regulada,
como é a da Medicina, podemos dar o exemplo da praxis da Direção Geral de Saúde
quando pede a colaboração de peritos para darem pareceres ou participarem na
preparação das Normas de Orientação Clínica (NOC) que regem atualmente a
prática da medicina clínica. Cada uma destas individualidades deve preencher um
documento onde declara por sua honra que não tem interesses
em qualquer das seguintes situações (anexo, página#12 ):
1
–Assalariado(a) de qualquer tipo de empresa que se dedique ao fabrico,
importação, ou comercialização de medicamentos, dispositivos ou suplementos
alimentares nos últimos 5 anos;
2 –
Interesses financeiros no capital de uma empresa farmacêutica ou clínica;
3 –
Consultadoria esporádica ou permanente, ou atividade pericial, remunerada
relacionada com a industria farmacêutica nos últimos 5 anos;
4 –
Outros interesses ligados ou com
repercussão no domínio em causa, que considere deverem ser do conhecimento da
DGS.
Este é um exemplo da transparência que se pretende
introduzir na vida do século XXI.
P -São
as imagens que de nós partilhamos autênticas? Que dizem de nós? Tudo? Nada?
R – As
imagens retiradas do seu contexto podem ser enganadoras. Por outro a “ferramenta
Photoshop” pode alterar cada imagem. Parafraseando Habermas (citado acima) “não
participo nas redes sociais” exceto nos exercícios que faço integrados neste
mestrado. Para quem participa recomendo que exerçam o bom senso e tenham
cuidado, incluindo quando ouvem e vêm os Chinese Backstreet Boys.
Parte III
P - Por
outro lado, como poderemos assegurar a autenticidade da informação?
R – Este
tópico é particularmente atual e de grande importância. Rheingold no seu livro
Net Smart, de 2012, tem um capítulo apenas dedicado aquilo que designa por Crap Detection. Resumimos em seguida
alguns dos seus conselhos:
Verificar onde está publicado na net, quem são os
autores da informação e onde trabalham;
Confirmar o que dizem outros sobre os autores;
Manter uma atitude permanente de ceticismo;
Fazer como o detetive da policia perante um homicidio:
os dados e as respetivas explicações são plausíveis?;
Triangular as fontes ou seja procurar mais 2 (ou mais)
locais independentes onde seja possivel confirmar (ou negar) a informação;
Mesmo os locais e as publicações de excelente
reputação nunca estão 100% corretos.
Eu
acrescentaria uma citação de Brigham (1985) que utilizo há muitas décadas:
"I know that half of what I teach as fact", said a wise
medical pedagogue "will be proven false in 10 years time. The hard part is
that I don't know which half"
Os
utilizadores de informação científica anteriores à revolução digital podem
testemunhar que estas recomendações aplicam-se quer ao mundo digital quer ao
mundo tradicional. O que é bom, já que se pode chegar à conclusão que as boas
práticas, neste caso em assegurar a qualidade da informação transmitida, são consistentes,
independentemente dos canais de acesso.
P - Pela
sua transparência?
R – A
problemática da transparência está intimamente ligada à autenticidade.
P - Quem
a valida ou autentica? Quem o poderá fazer? A própria comunidade, a própria
rede?
R – Cada
um de nós e todos na comunidade que partilham uma dada área do conhecimento
humano, o que pode ser designado como “peer review”. Nesta área a pesquisa-organização-publicação
do conhecimento beneficia imenso da nova era digital. A ponto de atualmente ser
regra haver a possibilidade de escrever um comentário logo que uma informação é
colocada ne rede. Tal não era possivel fazer com a estrutura tradicional da
impressão apenas em papel.
P - Será
pela transparência dos processos de partilha?
R – Neste
caso a transparência da forma como a rede e as suas comunidades funcionam é um
aspeto muito relevante.
P - Como
e em quem na rede poderemos confiar?
R – Em
todos e em ninguém (mesmo no self). Uma
atitude de ceticismo permanente é muito positiva no mundo da ciência quer em
rede quer no formato tradicional. A frase anterior (metade do que ensino é falso mas infelizmente não sei qual é a metade
verdadeira) documenta bem o nosso grau de ignorância em relação ao
conhecimento e a humildade que devemos praticar para continuar a perseguir o
que é menos errado.
P - Como
se poderá garantir a qualidade da informação e como se poderá garantir a
idoneidade da utilização dessa informação?
R
– É a pergunta cuja resposta vale um milhão de euros. Eu
diria com persistência e internautas atentos.
Posso dar um exemplo de uma metodologia que tenta
assegurar a autenticidade e a transparência da investigação científica que é
publicada na web (Anexo página#13):
A 12 janeiro 2014 às 17 h 05 minutos recebi uma mensagem de uma revista médica
informando-me (como co-autor de uma artigo submetido):
This is automatic notification that a submission on
which you are listed as an author has been received at the Editorial Office of
Clinical Microbiology and Infection.
If you have any concerns about the submission or your
role as a co‐author, please contact the Editorial Office immediately, quoting the
assigned manuscript identification number.
Em conclusão podemos dizer que a
Autenticidade e a Transparência nas relações humanas, quer interpessoais, quer lúdicas,
quer ainda profissionais, mantém-se como sempre foram. Como afirma Hanna Arndt (2007)
em 1951 a verdade é um bem absoluto que não é atingível. Temos de nos manter
muito atentos (e desconfiados) e no pouco tempo que dispomos (apenas 24 horas
por dia) evitarmos ser profundamente enganados.
Referências Bibliográficas
Arendt & Hanna (2007). A Promessa da
Política. Lisboa: Relógio D'Água Editores.
Baudrillard, J. (1991). Simulacros e
Simulação. Lisboa: Relógio D'Água.
Bortolotti, L. (2013). Introdução à
Filosofia da Ciência. Lisboa: Gradiva.
Brigham, K.L. (1985) - On being wrong in Science (correspondence) , New
Engl. J. Med. 312:794
Cardoso, G. & Colaboradores (2013). A
Sociedade dos Ecrãs. Lisboa: Tinta da China.
Castells, M. (2007). A Sociedade em Rede.
(3ª ed.) Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
Deutsch, D. (2013). O Início do Infinito -
Explicações que Transformam o Mundo. Lisboa: Gradiva.
Pena, R. & Colaboradores (2012). Como
Ensenar Utilizando las Redes Sociales. Tarragona, Espana: Publicaciones Altaria.
Rheingold, H.
(2012). Crap Detection 101: How to find what you need to know, and how to
decide if it´s true. In H.Rheingold (Ed.), Net Smart. How to Thrive Online
(pp. 77-109). Cambridge, Massachusetts: The MIT Press.
Schmidt, E. & Cohen, J. (2013). A Nova
Era Digital - Reformulando o futuro das pessoas, das nações e da economia.
Alfragide: Dom Quixote.